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  • Marcos Cintra - Folha de S.Paulo

Surdos ao canto da sereia

São alarmantes os atuais sintomas de "fisiologismo", uma doença histórica que afeta a política nacional. Oportunistas aproveitadores da avidez da população pelo extermínio das imoralidades praticadas na administração pública subiram aos palanques e apregoaram saídas urgentes e milagrosas para uma plateia crente e incauta. Essa plateia acreditava na eliminação de práticas que mais lembravam o obsoleto país do clientelismo e da barganha. Incauta por não perceber o jogo político, que, fácil e confortavelmente, levou muitos oportunistas ao poder. Agora, entre exauridos e atônitos, percebemos todos claramente que aquelas melhorias propostas por todos, nos diversos calendários eleitorais que tivemos, não passaram mesmo de promessas vazias e discursos inflamados de palanque. A conduta moral e sociologicamente condenável dos governos federal, estadual e municipal no tratamento da coisa pública chega a escandalizar até mesmo os menos informados. Descalabros administrativos, como os da Previdência e da Saúde, num vergonhoso desrespeito aos aposentados, tratados com desdém; a falta de uma política de assistência à infância; o susto semanal do brasileiro no supermercado; a impotência dos pais diante do orçamento esgotado pelas mensalidades escolares; os aumentos abusivos nos impostos de renda, IPTU, IPVA e ICMS; a situação dos transportes públicos; o desperdício da merenda escolar transformada em ração animal; denúncias de uso de verbas públicas para fins eleitorais — enfim, são centenas de casos no mínimo repugnantes. Verdades que atingem a consciência de cada brasileiro, desafiando os limites de sua tolerância.


O PDS de hoje, coeso e depurado, por estar livre daqueles que não resistiram ao chamado do poder, cedendo ao seu fisiologismo vicioso e ao populismo demagógico, tem uma postura bastante clara: não haverá composições com governos que busquem alternativas para seus próprios interesses obscuros. O partido só estará aberto a soluções e programas administrativos voltados às reivindicações populares.


Nesse sentido, aliás, o PDS recebe com satisfação a indicação do Dr. Adib Jatene para a pasta da Saúde. Embora não seja filiado ao partido, o novo ministro merece enorme respeito pelos serviços que já prestou a antigas administrações pedessistas e por sua reconhecida competência e idoneidade. No entanto, isso não moverá o partido um milímetro sequer na direção de um alinhamento automático com o governo federal.


Distantes das articulações e manipulações tendenciosas e parciais, os pedessistas não se dispõem a ouvir o canto sedutor e enganoso da sereia governista. Além da questão moral, aqui discutida em termos de nossa coerência e dos princípios do partido, ponderemos mais. Falemos da sucessão municipal que se avizinha e de nossa certeza de que discursos vazios e imediatistas não farão parte da ação pedessista, pois não há referencial de marketing melhor do que a visão cristalina da verdadeira situação em que se encontram nosso país, nosso Estado e nossa cidade.


Atentos, observamos a situação administrativa dos governos instalados nos últimos dez anos. Se, por um lado, sofremos como cidadãos as consequências de medidas condenáveis, por outro, podemos ver com esperança que o PDS tem um bom futuro. O destrutivo e implacável vírus da fisiologia passou longe dele e, para nós, a história vive uma nova etapa.



MARCOS CINTRA CAVALCANTI DE ALBUQUERQUE, doutor pela Universidade Harvard (EUA), professor da Escola de Administração de Empresas da Fundação Getúlio Vargas, consultor de economia da Folha e presidente regional do PDS.



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