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Marcos Cintra - Folha de S.Paulo

A reforma que virou pacote

De toda a discussão sobre a reforma tributária, sobraram, de concreto, apenas os dois projetos de lei que alteram a cobrança do Imposto de Renda.

A reforma tributária, pregada em verso e prosa como um dos pontos mais importantes no programa de revisão da Constituição, acabou no Irajá. Virou um pacote, como vem acontecendo, pontualmente, a cada final de ano.

O projeto de reforma do governo foi uma enorme decepção. Em realidade, acabou sendo apenas um remendo. Sua única característica reformista é a federalização dos impostos sobre circulação de bens e serviços. A unificação do ICMS, do ISS e do IPI implica unidade normativa do novo imposto no âmbito federal. A descentralização perdura apenas do ponto de vista administrativo, e isto, infelizmente, introduzirá exacerbação burocrática no processo de arrecadação. A previsão é de que estas alterações passem a vigorar apenas em 1997, se aprovadas no ano que vem.

Restou, portanto, o infalível pacote de final de ano, que inclui modificações técnicas no Imposto de Renda.

No IR, pessoa fisica, há importantes avanços. A desindexação da tabela de desconto na fonte é providência inevitável, dentro do objetivo de consolidação do Plano Real. Outras medidas justificáveis são a redução da alíquota intermediária de 26,6% para 25%, a provável eliminação da alíquota de 35%, a reintrodução do desconto padrão, o disciplinamento das deduções e muitas outras que eliminam casuísmos e dão maior racionalidade ao recolhimento do imposto.

Para o bolso do cidadão, as novas regras vão diminuir o imposto para aqueles com renda entre R$ 1.550 e R$ 16.200. A quase totalidade dos contribuintes do imposto de renda será beneficiada, de imediato.

Muitas críticas vêm sendo levantadas quanto às previsões inflacionárias embutidas na tabela de desconto do imposto de renda. Ela será corrigida em 13%, a partir de janeiro, e congelada para o restante do ano. Para 1996, está prevista inflação de 8%. Superada esta taxa, os contribuintes passarão a ter aumentos no imposto, caso seus rendimentos sejam corrigidos pela inflação.

E evidente que a intenção da administração ao prever uma taxa de inflação de 8% em 1996 é dupla. A primeira delas, de evidente ingenuidade, é sinalizar uma inflação de apenas um dígito para o próximo ano. A segunda, é garantir um aumento de arrecadação ao longo de 1996, na medida em que o congelamento da tabela fizer os contribuintes mudarem de faixa.

Ao encerrar seu primeiro ano, o governo acerta no varejo. Mas continua errando, vergonhosamente, no atacado. Melhora o imposto de renda, mas, ao não reformar o sistema como um todo, está apenas maquiando um aleijão. O país precisa de reformas, não de remendos.

 

Marcos Cintra Cavalcanti de Albuquerque, doutor em Economia pela Universidade de Harvard (EUA).

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