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  • Marcos Cintra

Os 3,5% de Bresser

A Folha divulgou ontem as projeções de crescimento industrial para o restante de 1987. Elaborados pelo IBGE, os números apresentados consubstanciam as afirmações do ministro Bresser Pereira de que a produção industrial brasileira deverá crescer cerca de 3,5%. Para maior facilidade de análise, os dados acham-se reproduzidos abaixo.


De fato, comparando-se o índice médio projetado para 1987 com o registrado no ano passado, nota-se que a indústria terá evolução positiva de 3,5%. Somando-se o crescimento do setor de serviços e o do produto agrícola, que responde por aproximadamente 10% do PIB, a economia deverá expandir cerca de 5% em 1987, caso as previsões para a indústria estejam corretamente dimensionadas.


Em primeiro lugar, cabe observar que as projeções do governo envolvem expectativas acerca de algumas variáveis que estão sob o seu controle, ainda que apenas parcialmente. Não se trata de avaliar o que deverá ocorrer no futuro de forma determinística. Antes, as estimativas refletem uma orientação de política econômica. Neste sentido, fica clara a disposição das autoridades de permitir o desaquecimento da economia, objetivando o controle das pressões inflacionárias e a recomposição dos superávits comerciais com o exterior. Como, no entanto, seria ilusório imaginar que o governo tenha em seu poder os instrumentos para regular o sistema econômico com precisão, os números mostram apenas que um desaquecimento ocorrerá, não se sabendo, porém, com que intensidade.


Mas as estimativas apresentadas ainda suscitam outras dúvidas. Embora não se conheçam os métodos de projeção utilizados, causa surpresa a maior volatilidade da produção industrial em 1987. Os índices mensais oscilam entre valores positivos e negativos em relação ao mês anterior, com maior frequência do que em 1986.


Nota-se, também, que embora o índice médio da produção industrial deva crescer 3,5% em 1987, em nenhum momento as projeções revelam que o pico de produção registrado em outubro de 1987 (144,50) será ultrapassado. De fato, os maiores índices de produção em 1987 serão os de agosto e outubro (cerca de 140). Percebe-se, assim, que o fluxo de produção será mais elevado no corrente ano. Porém, não serão necessários investimentos na expansão da capacidade produtiva.


Desta forma, não havendo incentivos para a formação de capital no setor industrial, as perspectivas de crescimento futuro continuarão comprometidas; persistirá a limitação de oferta que, em última análise, foi responsável pelo insucesso do Plano Cruzado. Romper este estrangulamento é, de fato, desafio. O pior que poderia ocorrer seria o país entrar numa trajetória de estagnação.


 

MARCOS CINTRA CAVALCANTI DE ALBUQUERQUE

Doutor pela Universidade de Harvard, chefe do departamento de Economia da FGV/SP, e Consultor de Economia da Folha.

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