Um plano de estabilização depende não apenas dos instrumentos de política econômica adotados. Depende também do ambiente institucional dentro do qual as medidas anti-inflacionárias são postas em prática.
Na semana passada descrevi as distorções introduzidas pela utilização de índices de custo de vida como indexadores. São coisas diferentes, que atendem necessidades distintas. O uso de índices de custo de vida como indexadores carrega a inflação passada para as correções futuras de preços. Em outras palavras, tornam necessárias medidas contracionistas mais profundas para debelar a inflação, além de reduzir salários reais e aumentar as margens de lucro.
Outra característica institucional que neutraliza a efetividade da política anti-inflacionária é a existência de moeda indexada, consubstanciada nos mercados de overnight. Já expus esta tese em outras ocasiões — não creio que tenha sido os outros economistas como Fernando de Hollanda e Álvaro Zini também esposam teses semelhantes.
O mercado de overnight deveria existir apenas para as operações bancárias, não sendo permitidas para o público em geral. Isto porque o over permite a criação endógena de moeda, e consequentemente dificulta o uso da política monetária. Para neutralizar o aumento automático da liquidez gerada no over, o governo é forçado a aprofundar a contenção monetária, elevando os juros muito além do que seria necessário, caso não houvesse moeda indexada.
O impacto distributivo desta política é evidente. Os detentores de moeda indexada estão em realidade obtendo das autoridades monetárias recursos de liquidez imediata a custo negativo, ao passo que os que dependem de crédito são punidos por juros exageradamente elevados. Aprofunda-se a recessão, já que os detentores de liquidez não se sentem estimulados a transformar sua liquidez em investimentos, os tomadores de crédito são elevados à insolvência, e os custos financeiros explodem desnecessariamente.
Esta é uma reforma estrutural inadiável para se controlar de vez a inflação no Brasil. A manutenção de liquidez imediata deve implicar custo positivo para os que a desejem. Apenas os que abdiquem de liquidez devem ser remunerados mediante a compra de títulos financeiros de médio e longo prazos.
Marcos Cintra Cavalcanti de Albuquerque, doutor em Economia pela Universidade de Harvard (EUA).