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Livro Indicadores Econômicos: Análise Conjuntural - Vol. 19 Nº 3 - 3º Trimestre - 1991
O objetivo deste trabalho é continuar a discussão acerca do imposto único sobre transações monetárias. Desde janeiro do ano passado, quando o tema foi colocado para debate em artigo publicado na "Folha de S.Paulo" (14/01/90), a polêmica tem sido bastante intensa. Pretende-se, aqui, avaliar algumas críticas, recolocar os principais argumentos e avançar em alguns pontos práticos na implementação da proposta.
A primeira parte destaca os principais aspectos do sistema tributário incorporado na proposta do IUT. Trata-se de uma nova concepção de administração fiscal, com características que não se confundem minimamente com a mera redução do número de impostos; na realidade, o fundamental são as inovações do ponto de vista de administração e de técnicas tributárias permitidas pelo IUT. A proposta é ainda discutida e avaliada em função de seu impacto no contribuinte, nas formas de gestão pública e nos mercados financeiro e de capitais. A segunda parte avalia o IUT segundo critérios de simplicidade, custo, equidade e eficiência. A terceira parte encaminha respostas a críticas ao IUT. Também propõe soluções para problemas práticos que poderiam surgir em sua implementação.
1.) O SISTEMA DO IMPOSTO ÚNICO SOBRE TRANSAÇÕES
a) A filosofia do IUT.
A ideia é simples: sobre as transações monetárias efetuadas no sistema bancário incidirá uma alíquota de 2%, dividida igualmente entre as contas correntes credora e devedora. A arrecadação será efetuada eletronicamente, automática e imediatamente distribuída às três esferas de governo, de acordo com critérios previamente definidos. Todos os atuais impostos serão extintos, mantendo-se apenas os que têm características extra-fiscais, por serem instrumentos de regulação e de política econômica.
Apenas as transações de capital, em que o objeto do pagamento é o próprio dinheiro, sofrerão tratamento especial. Saques e depósitos de numerário do sistema bancário serão sobretaxados — com uma alíquota dobrada de 4%, e as transações nos mercados financeiro e de capitais sofrerão tributação sobre os rendimentos reais.
O IUT é composto de dois importantes conceitos. O primeiro é a unicidade tributária. O segundo se refere à transação monetária como base, ou fato gerador, do tributo.
O imposto único tem uma antiga e respeitável tradição na economia. Contudo, nunca foi aplicado em sua plenitude, dadas as dificuldades na escolha do fato gerador. Trata-se de problema aparentemente simples, mas que nunca foi resolvido a contento. Na realidade, a evolução histórica impediu que se encontrasse uma solução.
O crescimento do Estado moderno fez com que suas necessidades de financiamento se expandissem vigorosamente em relação ao PIB. Por outro lado, nunca se conseguiu encontrar uma base tributária suficientemente ampla e abrangente para evitar que as alíquotas tributárias necessárias para realizar a arrecadação prevista fossem excessivamente elevadas. Se muito altas, haveria inevitável incentivo à sonegação e à evasão tributária. Ao mesmo tempo, se estariam introduzindo fortes elementos de ineficiência no sistema econômico.
Imaginando uma situação primitiva de total ausência de impostos, e se procurássemos uma base sobre a qual se imporiam tributos, se buscaria certamente a base mais ampla possível. Se exigiria ainda que o fato gerador do imposto pudesse ser facilmente identificado e transitasse por um sistema onde a cobrança fosse possível, e a evasão minimizada. Isto explica, por exemplo, que no Brasil colônia se chegou perto de um imposto único, o imposto alfandegário. Grande parte dos produtos transacionados eram importados e entravam por poucos portos, onde a arrecadação era realizada com facilidade. O afunilamento da base tributária nos portos marítimos fazia com que a importação fosse uma base tributária adequada. E de fato foi amplamente explorada em todo o mundo.
A solução atual para o dilema se encontra na utilização da transação monetária como a base de tributação do imposto único. Isto permite a unicidade tributária com baixas alíquotas. Todas as bases tributárias conhecidas atualmente são apenas subconjuntos da base tributária "Transação". A renda, a circulação, o comércio, a compra, a venda, os serviços, a operação financeira, são elementos do conjunto das transações. Portanto, taxando-se a transação monetária se resolve o dilema secular dos tributaristas, qual seja, maximizar a base tributária e minimizar as alíquotas marginais.
O paralelo com a situação atual é imediato. Se fôssemos hoje procurar a base tributária mais ampla possível — para com isto minimizar a alíquota e, portanto, minimizar a ineficiência introduzida pela cunha fiscal — certamente a transação monetária seria escolhida. Toda atividade econômica gera transações que também se afunilam em nódulos onde a arrecadação poderia ser realizada. Trata-se do sistema bancário, por onde transitam praticamente todas as transações monetárias. É preciso acrescentar que a transação monetária, quando no passado era realizada com o uso de moeda manual, não era passível de tributação. As transações eram difusas, sem qualquer possibilidade de efetiva cobrança. Na realidade, exigiria um fiscal para cada contribuinte.
A modernização e a permeabilidade do sistema bancário, o avanço dos sistemas de controle e escrituração, e os recursos de informatização, permitiram a transformação da transação monetária em uma base impositiva concreta, facilmente explorável. Portanto, o IUT é um imposto com raízes antigas, mas é também contemporâneo, pois é produto da modernização, expansão e informatização do atual sistema bancário.
A transação monetária será a base tributária do futuro. Impostos como o IUT serão comuns nas próximas décadas. Cabe lembrar que a viabilidade da aplicação do IUT no Brasil não surge como um acidente histórico, mas como a resultante de uma situação concreta: o Brasil tem, sabidamente, um dos mais avançados e modernos sistemas bancários de todo o mundo.
Ainda no campo das características próprias do IUT cabe ressaltar sua extrema simplicidade, automaticidade e baixo custo de arrecadação. O tributo será cobrado em alguns poucos nódulos de transações monetárias, ou seja, nos CPDs dos bancos, e a fiscalização terá baixo custo, podendo se reduzir a periódicas verificações dos programas dos computadores bancários que administram os lançamentos nas contas correntes dos clientes. Não haverá necessidade de identificar operações individuais (que violaria o sigilo bancário), mas apenas verificar se a totalização das transações monetárias gerou a arrecadação esperada.
Como todas as atividades econômicas de mercado geram transações monetárias, e como elas se concentram nos nódulos bancários, não há evasão tributária. Minimizam-se, assim, a sonegação e a economia informal. Na realidade, se estará trazendo à luz a imensa economia subterrânea brasileira. Está-se também abrangendo aquela parte da economia formal que não escritura transações, não registra funcionários ou subfatura.
Sob o prisma psicológico, o IUT terá a vantagem de transformar a delinquência econômica em cidadania tributária. Todos passarão a contribuir para o custeio das atividades do Estado. Todos estarão envolvidos na busca de maior eficiência no uso dos recursos públicos. Ninguém se sentirá alheio à corrupção e à malversação do dinheiro público.
Mas a principal característica conceitual do IUT é que ele dispensa a apuração dos tributos devidos, assim como o recolhimento individual dos mesmos. Não haverá escrituração fiscal, apuração de resultados para efeitos tributários ou qualquer burocracia para o recolhimento dos impostos. Minimiza-se a fiscalização e a corrupção.
Do ponto administrativo e operacional, o IUT guarda enorme vantagem em relação à atual sistemática tributária. Na realidade, o atual sistema tributário é absurdo, e seria impensável caso se estivesse começando a elaborar, do zero, uma proposta tributária.
Imaginemos uma economia moderna, onde não houvesse impostos. Seria inconcebível uma estrutura tributária onde cada uma das centenas de milhões de pessoas teria que escriturar e apurar o imposto que cada uma deveria contribuir? Seria imaginável que se aprovasse um sistema onde a fiscalização seria feita individualmente, em cada livro, em cada transação, em cada compra ou venda de cada agente econômico? Seria imaginável aprovar um sistema onde o regulamento de cada um dos dois dezenas de impostos fosse composto de vários volumes de decretos, atos, leis, portarias, etc., tornando absolutamente inviável o conhecimento da lei tributária por parte dos próprios contribuintes?
É evidente que tal sistema jamais seria aprovado. Contudo, é o que existe hoje. A atual colcha de retalhos só pode ser explicada pela perversa evolução do sistema tributário brasileiro, frequentemente e casuisticamente modificado pelas bordas, de forma aleatória e irracional.
b) Impacto nos contribuintes e no setor público
Há um inequívoco consenso no Brasil: não há mais como manter a atual estrutura tributária, por ser custosa, ineficiente e injusta. E sobretudo, incentivadora da sonegação, da evasão e da economia informal.
Há que se buscar um novo sistema, capaz de reduzir custos de arrecadação, nas três esferas de governo, e nas empresas onde os custos de escrituração tributária podem chegar a 40% das despesas administrativas; há que se eliminar a sonegação e a evasão, fenômenos profundamente arraigados no comportamento dos contribuintes. Não se trata de uma pré-disposição cultural ou de um vício de personalidade, mas simplesmente uma resposta racional e natural a um sistema caótico e irracional.
Governos estaduais e municipais devem contar com fontes seguras de recursos, sem a necessidade de mendigar ou negociar verbas. As populações locais têm direito aos recursos e aos investimentos sociais disponíveis, independentemente da posição política de suas lideranças. A proposta do Imposto Único sobre Transações (IUT) é um passo fundamental para garantir a desejada autonomia financeira de estados e municípios, implicando sua independência financeira. Diariamente, os bancos de todo o país creditariam nas contas correntes de todos os estados e municípios a sua parte na arrecadação daquele dia, sem qualquer intermediação, exigência ou pré-condição.
Cabe acrescentar ainda que, para facilitar a transição para o IUT, poderia-se garantir a neutralidade distributiva mediante uma regra simples de partilha dos tributos globais. Cada nível de governo teria participação equivalente à mesma proporção das receitas tributárias disponíveis sobre a tributária bruta obtida na média dos últimos dois ou três exercícios fiscais. Por exemplo, suponha-se que o município X tenha direito — de acordo com o critério acima descrito — a um percentual da arrecadação global do IUT. Assim, ao final de cada dia, todas as agências bancárias, em todo o país, transfeririam para a conta corrente do município X o equivalente à sua parte do imposto arrecadado naquele dia.
O IUT é a garantia da autonomia financeira de todos os níveis de governo. Fortalecerá a democracia, gerará uma população cidadã — capaz de identificar e defender seus interesses — e formará uma classe política altiva, que não mais precisará se curvar às exigências dos donos dos cofres públicos.
Impacto nos mercados de capital e financeiro
As transações envolvendo capital financeiro ou monetário como agente passivo da operação constituem um caso particular interessante. Nas operações liquidadas mediante o uso de moeda manual, a sobretaxa tributária aumentará o custo da transação. Assim, haverá desestímulo ao uso de moeda e, consequentemente, à evasão tributária.
Quanto às transações financeiras e do mercado de capitais, deve-se fazer um paralelo com as transações reais. Na medida em que uma operação financeira pode ser descrita como aluguel de capital, não há como tributar o valor do objeto da locação, mas apenas a remuneração pelos serviços que presta. No caso de um aluguel residencial, por exemplo, o IUT incidirá sobre o valor dos serviços da locação, e não sobre o valor do imóvel locado. Da mesma forma, nas transações financeiras deve-se tributar apenas os rendimentos reais da operação, e não o valor do capital cedido.
A operacionalização do sistema mantém princípios de automaticidade e ausência de apuração de resultados por parte do contribuinte. Propõe-se que as operações financeiras sejam realizadas exclusivamente por meio de contas bancárias especiais, à semelhança das contas de poupança. Diferentemente das contas de movimento, as contas especiais somente poderiam receber créditos ou débitos de outras contas especiais, ou da conta movimento do mesmo titular.
Os créditos nas contas especiais serão isentos de tributação, e os valores creditados advindos da conta movimento do titular serão corrigidos diariamente para apuração, a qualquer momento, de seu saldo corrigido. Quando do débito da conta especial a crédito da conta movimento do titular, o valor transferido sofrerá a tributação automática incidente sobre o montante que ultrapassar o saldo corrigido, a uma alíquota equivalente à alíquota média do IUT. Alíquotas marginais de 2% resultarão em uma alíquota média de 25%, que será incidente sobre os ganhos reais auferidos nos mercados financeiro e de capital.
Cabe apontar que, como a incidência neste caso não será cumulativa, para evitar perda de base tributária, deve-se aplicar a tributação pela alíquota média, e não pela marginal. Essa proposta permite que a tributação no mercado financeiro e de capital seja realizada com a mesma simplicidade e automaticidade do restante da economia. Além disso, elimina o risco de desintermediação financeira. Qualquer transação financeira que ocorra fora do sistema bancário será tributada regularmente em 2%, incidindo sobre o capital mais rendimentos.
2. Avaliação do IUT
Simplicidade e custo formam o primeiro requisito de um bom imposto. Deve-se avaliar a facilidade de sua aplicação e o custo de arrecadação — não apenas os incidentes sobre o setor público, mas principalmente os encargos administrativo-tributários do setor privado.
Sob este prisma, o IUT recebe excelente avaliação. Por ser automaticamente arrecadado a cada operação bancária, torna-se simples e de baixo custo. Reduzirá custos sociais e privados ao minimizar as despesas de fiscalização — que serão controles de sistemas e de programação dos computadores bancários — e eliminará a necessidade de coletorias e de controles de arrecadação e de partilha de tributos. Minimizará os gastos do setor público, inclusive os judiciais e de processamento de dados.
No setor privado, haverá uma enorme redução dos custos administrativos, liberando recursos humanos que poderiam ser utilizados na gestão gerencial, e não na estéril escrituração e apuração tributária, que pouco contribuem para a geração de riqueza. O empresário poderá se dedicar integralmente ao seu negócio, ao invés de gastar parte substancial de seu tempo e de seus recursos com mera administração tributária.
Sob o prisma da eficiência, o IUT também recebe boa avaliação. Um imposto é tanto menos ineficiente quanto mais baixa for sua alíquota marginal, ou seja, quanto menor for a cunha fiscal. Assim, um imposto com alíquotas elevadas, como as que compõem o sistema tributário brasileiro, introduz fortes elementos de ineficiência na medida em que, do ponto de vista alocativo, geram decisões diferentes das que seriam tomadas em sua ausência.
O IUT, por contar com um fato gerador de grande abrangência, favorece a minimização da alíquota marginal. Sob o prisma da análise de custo parcial, esta conclusão é reforçada pela divisão da alíquota entre os dois participantes na transação monetária.
A equidade é o terceiro critério de análise a que deve se submeter o IUT. Inicialmente, cabe lembrar que a atual sistemática tributária brasileira é notoriamente injusta e regressiva. Tomando-se apenas o imposto de renda como exemplo, nota-se que deixa muito a desejar para justificar sua fama de imposto da cidadania, imposto justo, progressivo, social e outras alegadas virtudes.
O IUT é um imposto híbrido. Na medida em que incide sobre a renda salarial, lucros, juros e aluguéis, é um tributo direto proporcional — nem regressivo nem progressivo. Com a vantagem de que sua proporcionalidade não poderia ser transformada em regressividade por força do potencial de evasão das famílias de mais alta renda, que, ao receberem "fringe benefits" e ao lançarem despesas pessoais como sendo de suas empresas, acabam disfarçando a distribuição de lucros e destruindo a progressividade do imposto sobre a renda. Como com o IUT não haverá formas de evadir a tributação, esse risco não surge, garantindo, portanto, a proporcionalidade do IUT como imposto direto.
Contudo, o IUT também é um imposto indireto na medida em que incide cumulativamente durante a formação dos custos de produção. Nesse sentido, a progressividade deve ser buscada no imposto embutido no custo dos produtos adquiridos pelos consumidores finais.
Há uma diferença fundamental entre o IUT, que é um imposto cumulativo, e os impostos indiretos sobre o valor adicionado. Neste último caso, o custo tributário embutido no preço é exatamente a alíquota do IVA. Portanto, com alíquotas únicas, o IVA torna-se um imposto regressivo na medida em que a incidência tributária é constante no valor de cada produto, onerando igualmente segmentos de renda diferenciada. No conjunto dos gastos das famílias de diferentes segmentos de renda, e com alíquota única de imposto sobre valor adicionado, a incidência tributária seria proporcional aos dispêndios. Portanto, o IVA é regressivo na margem e proporcional na média dos gastos familiares.
Essa conclusão não é válida para o IUT. Por ser cumulativo, a parcela de impostos no custo final dependerá do processo de produção. Quanto mais longa a cadeia produtiva, maior o número de transações, e, consequentemente, maior a incidência de impostos no custo de produção e no preço final. Isso faz com que a análise da progressividade do IUT dependa da composição dos gastos das famílias nas diversas faixas de renda.
Seria lícito supor que, na composição total dos gastos de famílias de alta renda, será mais elevada a participação de produtos mais sofisticados, com tecnologia avançada e elevados níveis de especialização na fabricação de componentes, portanto, com um maior número e mais alto valor de transações monetárias por unidade de produto. Já as famílias de renda mais baixa teriam uma participação maior de produtos de consumo básico, mais simples, e com processos produtivos menos complexos.
Assim, as famílias de alta renda sofrerão, no conjunto de seus gastos, uma tributação proporcionalmente mais elevada do que as famílias de renda mais baixa. Nota-se, portanto, que a afirmação usualmente feita no sentido de que os impostos indiretos são sempre regressivos é incorreta. É verdade que, na margem, ou seja, para produtos analisados isoladamente, o IUT seria regressivo. Contudo, o que interessa avaliar é a progressividade na média de todos os gastos das famílias, e nesse caso o IUT é progressivo.
O IUT apresenta enorme flexibilidade do ponto de vista operacional. Nesse sentido, torna-se possível garantir imunidade tributária para as transações que não envolvam trocas de mercado ou que mereçam tratamento favorecido por força de decisões políticas. Isso inclui doações ou transferências de recursos, movimentações bancárias de igrejas, entidades filantrópicas e outras de reconhecido interesse social, de qualquer natureza. Da mesma forma, seria possível, por exemplo, isentar as transferências financeiras realizadas pelos níveis de governo, evitando a necessidade de criação de "créditos presumidos" em função do imposto incidente sobre gastos públicos.
Finalmente, do ponto de vista macroeconômico, deve-se ressaltar que o IUT minimiza a incerteza e a variabilidade da arrecadação tributária, facilitando a realização de políticas anticíclicas de receita e despesa pública. Em épocas de recessão, o montante arrecadado diminuiria sensivelmente menos do que os tributos sobre valor adicionado. Inversamente, a expansão da arrecadação em períodos de crescimento econômico estaria relativamente mais moderada, garantindo, portanto, maior estabilidade da receita pública, independentemente do ciclo econômico.
3. RESPOSTAS A ALGUMAS OBJEÇÕES
Teme-se, infundadamente, que o IUT possa levar à monetização, dolarização ou até mesmo ao uso de instrumentos de crédito (como cheques endossados ou notas promissórias) em substituição às transações bancárias. Antes de elencar algumas simples providências administrativas que praticamente eliminariam essa possibilidade, é importante apontar os fatores que influenciam a decisão de um agente econômico de evitar uma transação bancária.
Como toda decisão econômica, essa escolha resulta de uma comparação entre os custos e benefícios das várias alternativas disponíveis. A decisão de abrir mão dos serviços bancários — e das inúmeras vantagens e redução de custos de transação que eles oferecem — envolve uma comparação entre os ganhos e os custos dessa escolha.
Do lado dos benefícios marginais, está apenas a vantagem da economia tributária, na medida em que se estaria evitando o pagamento equivalente ao IUT devido. Já os custos marginais da transação monetizada, dolarizada ou pactuada mediante a troca de um instrumento de crédito formariam uma longa lista de valores elevados. Tomemos, inicialmente, o caso da transação monetizada.
A proposta do IUT prevê uma sobretaxa tributária sobre operações de saque ou depósito de numerário no sistema bancário. Sobre essa transação, aplicaria-se uma alíquota equivalente ao número estimado de transações que esse volume de moeda realizaria antes de retornar ao sistema bancário. A alíquota aplicável a saques e depósitos seria o dobro da alíquota regular de 2%. Assim, qualquer agente econômico que efetuasse pagamentos em dinheiro teria um custo inicial de 4%, o que é quatro vezes a alíquota cobrada se o pagamento fosse intermediado pelo sistema bancário.
A proposta do IUT também prevê que o depósito de numerário no sistema bancário sofra uma sobretaxa. Nesse sentido, o parceiro de uma transação monetizada exigiria um sobrepreço para receber o pagamento em dinheiro, a não ser que pretenda entesourar a moeda — o que é improvável em economias com inflação crônica, como a brasileira — ou que já tenha um pagamento em dinheiro contratado para ser concretizado em seguida. No entanto, nessa última circunstância, o problema não desaparece; apenas se transfere para o parceiro da transação monetária seguinte.
Além da sobretaxa, outros custos aumentam a despesa da transação monetizada, como os riscos de segurança do numerário e custos adicionais de transporte de valores elevados. Em outras palavras, desde que o sistema bancário existe — especialmente o brasileiro, que é um dos mais sofisticados do mundo — dificilmente os agentes econômicos abririam mão das vantagens que ele oferece. Na verdade, a tendência mundial é o rápido desenvolvimento da moeda escritural e da moeda eletrônica, em detrimento da moeda manual, aquela “relíquia bárbara” apontada por J.M. Keynes com notável senso de antecipação.
O mesmo raciocínio se aplica à decisão de dolarizar ou pactuar transações monetárias. No caso do uso da moeda estrangeira, incorrem-se riscos de flutuações aleatórias em seu valor; quando da reconversão em moeda nacional — seja na transação interna, seja na movimentação de contas no exterior — o “spread” e os custos de remessa provavelmente seriam superiores à economia tributária que a dolarização poderia proporcionar.
No caso de promissórias e cheques endossados circularem como moeda, apenas o risco de recebimento encadeado de ordens de pagamento de desconhecidos já seria um desestímulo para esse comportamento. O "spread" de risco da operação inviabilizaria a generalização dessa prática frente à economia tributária que ofereceria.
Além disso, ainda podem ser adotadas providências administrativas simples. Por exemplo, o custo da transação monetizada poderia ser aumentado se o valor de face das notas fosse baixo ou se fosse proibido o saque de numerário acima de determinados limites. Os cheques poderiam ter datas de validade; os cheques ao portador e o endosso poderiam ser proibidos (como já acontece com os cheques emitidos com os dizeres “para depósito apenas na conta do favorecido”); e os documentos de crédito ao portador poderiam sofrer pesadas multas revertidas em favor do apresentador do documento ilegal. Quanto à dolarização, bastaria aplicar rigorosamente a lei que define como crime qualquer pagamento em moeda estrangeira no território nacional.
Outro temor, igualmente infundado, é o da verticalização do processo produtivo. Adotando-se a mesma metodologia de análise, verifica-se facilmente que o IUT implicará uma reversão dos incentivos à verticalização de origem tributária pela simples razão de que, hoje, o Finsocial e o Pis-Pasep já representam 2,65% do faturamento das empresas, implicando incentivo mais forte à verticalização do que o IUT.
Além disso, é necessário relativizar os incentivos tributários à verticalização. No processo decisório, os argumentos tecnológicos são mais poderosos, como a vantagem da especialização evidenciada nas modernas economias, as economias de escala e de especialização, e outras externalidades. Por essas razões, seria insensato imaginar que a verticalização ocorra, por força do IUT, além do que seria determinado pelas relações tecnológicas e econômicas de produção. Como exemplo, caberia indagar se as montadoras de veículos investiriam em suas próprias indústrias de vidros, pneus ou aço plano para economizar 1% do valor de cada um desses componentes no preço final de um veículo.
Outros críticos temem o problema da distribuição dos impostos arrecadados em uma federação. A questão da partilha é totalmente colateral à proposta do IUT. Ela terá de ser enfrentada por qualquer reforma tributária. No caso do IUT, será necessário uma lei especial que regulamente a partilha tributária entre os vários níveis de governo, tema que deve ser discutido no Congresso.
Para garantir a neutralidade inicial do IUT, sugere-se que cada nível de governo mantenha a mesma proporção na carga tributária bruta, incluindo a previdência. Isso evitaria que a discussão da partilha, sempre polêmica, prejudique a discussão do sistema do IUT, que em nada depende dessa questão essencialmente política.
A implantação de um imposto cumulativo não inviabiliza a desoneração tributária das exportações, apenas a torna mais transparente, transformando o incentivo fiscal em rebate ou devolução do imposto efetivamente recolhido. É necessária uma análise empírica dos setores exportadores para identificar e devolver os tributos pagos ao longo do processo produtivo.
O IUT poderia contribuir para aperfeiçoar as formas de proteção e incentivo, eliminando o uso excessivo de isenções fiscais e exigindo a utilização de outros instrumentos, como subsídios e devolução de tributos, que requerem quantificação prévia e restringem abusos.
4. IMPACTOS MACROECONÔMICOS
O IUT tornou-se uma proposta polêmica. Sua implantação implicará uma enorme economia de recursos desperdiçados na tarefa de escrituração tributária nas empresas, além de reduzir a economia informal e os custos de fiscalização e arrecadação do Estado. No entanto, essas características levantaram suspeitas de que o IUT poderia causar um aumento no desemprego.
Na realidade, o IUT implica uma mudança similar à de qualquer inovação tecnológica: reduz custos, aumenta a eficiência e incrementa a produtividade sem diminuir a receita. A busca da eficiência e da produtividade não causa desemprego; pelo contrário, é uma forma de aumentar a competitividade, melhorar o poder aquisitivo dos salários e estimular o crescimento econômico.
O setor público poderá reorientar recursos humanos para melhorar a fiscalização dos gastos governamentais, minimizando desperdícios e ineficiências. No setor privado, os recursos atualmente dedicados a rotinas tributárias improdutivas podem ser direcionados para o aperfeiçoamento de controles gerenciais e administrativos.
O impacto macroeconômico mais significativo do IUT ocorrerá na estrutura produtiva. Como um imposto cumulativo, o IUT poderá alterar significativamente os custos relativos e, consequentemente, impactar a estrutura produtiva global e a própria taxa inflacionária. Será necessário um rígido controle da aplicação do IUT, sem diferenciação de alíquotas.
O IUT também poderia ser a base para um amplo entendimento nacional, acomodando os interesses dos principais grupos envolvidos — trabalhadores, empresários e governo — e criando condições para um diálogo necessário no país. O IUT oferece ganhos a todas as partes: redução de custos e desburocratização para o setor público, recomposição salarial para os trabalhadores e redução de custos e aumento de mercados para o empresariado.
A implementação do IUT teria importantes efeitos positivos: facilitaria o ajuste fiscal, fortaleceria o sistema bancário nacional e contribuiria para um maior controle e transparência no uso dos recursos públicos.