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Marcos Cintra

Troca da guarda

Marcos Cintra Cavalcanti de Albuquerque


Poucos ainda acreditam que a atual equipe econômica reúna condições para permanecer no governo. O desgaste sofrido pelos ministros da área, bem como pelos seus principais assessores, não deixa qualquer espaço de manobra para que possam gerir a economia brasileira com um mínimo de eficácia e legitimidade.


Nesse sentido, dificilmente poderá se evitar que o realinhamento de preços atualmente em curso degenere em uma desordenada corrida de preços, salários e juros, levando a inflação a patamares nunca antes imaginados. Isso acontece em um momento em que o confortável superávit comercial de US$ 12 bilhões não existe mais, o capital estrangeiro de risco está fugindo e o de empréstimo se torna cada vez mais difícil de atrair.


Trocar a equipe econômica é uma consequência natural dos acontecimentos. A questão é quando. Se realizada agora, coincidirá com a necessidade de uma grande limpeza na casa, um trabalho sujo e desgastante para a imagem dos novos ministros que assumirem. O realinhamento de preços envolverá enormes conflitos com os sindicatos dos trabalhadores que pressionarão por correções salariais preventivas, bem como fricções dentro dos próprios ramos de produção em cada setor. A contenção do consumo terá de ser feita, mesmo com juros explosivos, ou então, dando uma de "joão-sem-braço" na correção das tabelas de Imposto de Renda.


Assim, a melhor alternativa seria deixar a atual equipe fazer a faxina, abrindo caminho para outra que possa implementar uma nova estratégia de estabilização. Mais sessenta ou noventa dias é esse o sacrifício que o presidente Sarney deve estar pedindo de seus auxiliares econômicos. Se assim não fosse, o que justificaria a permanência no governo de pessoas que abertamente criticam o desenrolar do Cruzado 1 e a própria concepção do Cruzado 2?


Mas não é apenas uma cerimonial troca da guarda que está em pauta. O governo precisa abrir caminho para outro estilo de política econômica, mais aberto, mais negociado; mas também sem pedir que algum dos interlocutores cometa haraquiri. Daí a inviabilidade de um "pacto reformista" que altere profundamente o atual equilíbrio de forças dos agentes econômicos. Neste grau de inviabilidade se incluem propostas de negociação que colocam pré-requisitos como a moratória, a revogação do Cruzado 2, a redução dos salários reais, ou dos lucros, a eliminação total do déficit público e outras teses de nenhuma exequibilidade. A prosseguir desta maneira, o governo deveria dar por encerrada a tentativa do pacto.


O único caminho factível seria um "pacto circunstancial" cuja meta principal é evitar a deterioração da atual conjuntura, ajustando apenas na margem alguns pontos de conflito que, se não resolvidos, poderão iniciar um processo envolvendo perdas para todos. Também a consecução do pacto social exigirá uma nova equipe econômica e uma nova abordagem. Sem confiança no oponente, só se senta em uma mesa de negociação para lhe infligir derrotas; para negociar uma trégua, um "pacto circunstancial", é necessário confiança mútua. Isto não mais existe, ao menos em direção ao governo, que tenta de tudo, até um "pacto maroto", achando que a troca do IPC restrito pelo INPC vai atrair os aplausos dos trabalhadores - há quem acredite que a "concessão" do governo só ocorreu porque o IPC restrito apurado foi maior que o INPC.


Por fim, cabe indagar sobre os interlocutores do pacto. Numa democracia, o Congresso é a representação da vontade popular. O governo deveria estar negociando, num primeiro estágio, com o partido que lhe dá sustentação. Ou será que este apoio não existe? Neste último caso, estará aberto o caminho para mais uma grande crise brasileira.

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