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Marcos Cintra

Zoneamento em crise e em caos

As leis de zoneamento na cidade de São Paulo, após 20 anos de existência, passaram por poucas alterações e atualizações. Evidentemente, ficaram ultrapassadas e não acompanharam a evolução de nossa metrópole. Tudo permanece mais ou menos como era em 1972.


A lei de zoneamento deve disciplinar. Deve ser rígida o suficiente para não permitir um processo de regressão de costumes, de autofagia, de retrocesso comportamental, de agressões mútuas entre os cidadãos.


Por outro lado, não pode ser excessivamente madrasta a ponto de se tornar socialmente inaceitável, e assim induzir a população a repudiá-la. Quando isto ocorre, o resultado são construções e atividades clandestinas, desordem, anomia e muito descontentamento.


A cidade de São Paulo vem se tornando tão mais caótica quanto mais rígidos os controles burocratizantes e tecnicocráticos que se lhe tentam impor.


Exemplo gritante desta assintonia entre comportamento indisciplinado da população e o anseio do burocrata é a desastrosa ocupação das zonas de mananciais da cidade de São Paulo.


A legislação que buscava proteger os reservatórios de água da zona sul da Cidade continha uma estratégia errônea e desvalorizou as áreas de terra naquela região.


Preço baixo, desinteresse dos proprietários e grande déficit habitacional se juntaram em uma lamentável combinação que resultou na enorme deterioração urbana daquela região, caótica ocupação, com resultados desastrosos do ponto de vista ambiental.


O problema é ainda mais grave ao se atentar que, do ponto de vista da legislação municipal, as alterações das leis de zoneamento exigem a concordância de um mínimo de dois terços dos vereadores.


Ora, em um sistema político proporcional, trata-se de proeza próxima do impossível.


Outro exemplo. Em 1972, criaram-se várias zonas Z-8. Eram zonas especiais. Como os legisladores da época não sabiam como tipificar estas áreas, não se acanharam em congelá-las, batizando-as com pomposa categoria de Zonas de Uso Especial. Criaram-se verdadeiras "zonas proibidas", no aguardo de definições mais precisas que deveriam ocorrer em prazos rigidamente definidos.


Nada aconteceu, e estas áreas estão "congeladas" até hoje. Seus proprietários sofreram uma espécie de desapropriação branca, sem indenização. E a cidade viu-se forçada a produzir enormes vazios urbanos, inaproveitados, embora dotados de custosa infraestrutura.


Esta situação perdura quase sem modificações até hoje.


Mais exemplos? Novos corredores de tráfego surgem a cada dia. Como a legislação não vem acompanhando e induzindo de forma racional o uso do solo nestas regiões, a clandestinidade impera. Só não enxerga quem não quer. Escritórios comerciais e de serviços em zonas residenciais são hoje mais regra do que exceção.


A Secretaria do Planejamento na cidade de São Paulo, ciente destes fatos, deu início durante a administração Paulo Maluf a duas linhas de ação para ajustar a legislação urbanística.


A primeira, mais imediata: Já está concluído um rol de alterações na legislação de uso e ocupação do solo que corrigem algumas distorções. O prefeito já está com posse de projetos aprovados pela CNLU (Comissão Normativa de Legislação Urbanística) que aperfeiçoam as zonas de uso industrial e que descongelam várias áreas Z-8. Também já recebeu da Secretaria do Planejamento projeto de lei que atende a uma antiga e tradicional reivindicação da população paulistana: fazer vilas residenciais, como antigamente.


A segunda linha de ação propõe um novo Plano Diretor para a Cidade.


O cronograma inicial da administração Paulo Maluf previa a apresentação de uma primeira versão para discussão pública em janeiro de 1994. Espera-se que o atual secretário do Planejamento, Cláudio Lembo, mantenha o cronograma, pois a experiência mostra que se a administração apresenta o projeto de Plano Diretor nos últimos dois anos de seu mandato, o tempo torna-se curto para a aprovação. A administração seguinte retira o projeto para apresentar outra versão. E inicia-se um círculo vicioso.


Em resumo, a cidade de São Paulo acha-se imersa em sérios problemas no que diz respeito ao uso e ocupação do solo. É preciso tirar teias de aranha de cima dos nossos códigos urbanísticos.


O AUTOR Marcos Cintra é professor da FGV e líder do governo na Câmara Municipal de São Paulo.





Publicado no Jornal da Tarde.


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