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  • Marcos Cintra - Diário do Comércio

Planejamento urbano

As dificuldades para planejar uma cidade que preexiste ao planejador, que já desenvolveu características próprias, são imensas. No máximo o que se consegue é congelar o status quo, através de limitações urbanísticas para evitar que a cidade tome rumos indesejáveis. Foi o que fizeram os planejadores que conceberam as atuais regras de zoneamento da Capital. Apoiados em pesquisas sobre o uso e ocupação do solo, identificaram áreas homogêneas que levaram às atuais restrições. Mas foi um grande erro imaginar que a mera formulação de códigos urbanos seria capaz de alterar padrões de comportamento firmemente enraizados na cultura da cidade. Na região de proteção aos mananciais, por exemplo, não se conseguiu reverter a ocupação irregular, que continuou em expansão acelerada, apesar das rígidas normas de ocupação daquela área.


O planejamento em uma cidade madura como São Paulo não pode ser voluntarista. Se for, surgirão tensões insuportáveis, onde não se encontrarão culpados. Se o fiscal cumpre a sua obrigação ao fazer valer a lei, o cidadão possui a seu favor a negligência e, até mesmo, o beneplácito do poder público que, no passado, mostrou-se sempre complacente, ou conivente com as irregularidades que hoje tenta impedir.


Portanto, o planejador urbano não pode partir de uma tábula rasa. O urbanismo em cidades como São Paulo deve ser um meio de solucionar problemas e superar impasses, mais do que um instrumento para arquitetar novos espaços. Precisa, pois, atrair mais economistas, cientistas políticos, sociólogos e tecnólogos para complementar o esforço dos arquitetos.


No caso da região dos mananciais, uma visão voluntarista de planejamento recusar-se-ia a aceitar qualquer ocupação irregular, por mais consolidada que seja. Tanto que urbanistas com esta visão já chegaram a propor a remoção de cerca de 1 milhão de habitantes da região.


A visão de planejamento como problem-solving assimilaria a ocupação. Ante a impossibilidade de remover aquelas populações, proporia soluções técnicas capazes de harmonizar a presente ocupação, com o emprego de métodos disponíveis de saneamento ambiental. A visão voluntarista conduz ao esclerosamento daquela parte da cidade, ao passo que esta recupera, ainda que deixe algumas cicatrizes e sequelas.


Outro caso instrutivo refere-se à demarcação de zonas estritamente residenciais. A visão voluntarista impõe rígidas limitações de uso, como definidas na atual lei de zoneamento. Já o planejamento resolutivo buscaria incorporar a tendência moderna de uso e ocupação do solo urbano, na qual a distinção entre local de moradia e local de trabalho fica cada vez mais tênue e indefinida. A era da informática e da globalização da informação aproximou esses espaços de forma irreversível, fazendo cidades terciárias como São Paulo se distanciarem dos paradigmas clássicos das cidades industriais de antigamente.


Enfim, não há como moldar cidades seculares como São Paulo a modelos conceituais abstratos com o estabelecimento de padrões de comportamento que não se identificam com a cultura da cidade e de seus cidadãos. Antes de impor o planejamento deve induzir a população a se comportar de forma afim com o padrão desejado. Cidades como São Paulo necessitam de normas disciplinadoras para evitar o crescimento desordenado. Mas a prioridade deve ser o uso do planejamento como método para solucionar problemas emergentes.



Marcos Cintra é vereador da cidade de São Paulo.

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