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  • Marcos Cintra

Basta 1% do Imposto Único



"A ideia do imposto único não é, ao contrário do que diz a sabedoria tradicional dos realistas, ingênua nem inexequível. É apenas insolentemente nova, cujo tempo já chegou." (Roberto Campos)


Em um artigo neste espaço em 6 de junho último, o auditor fiscal José Rui Gonçalves Rosa diz que com a alíquota de 1% o imposto único não seria capaz de financiar o Estado de forma não inflacionária. Afirma ainda que o imposto único torna-se mais pesado com inflação baixa. Mostrarei que a crítica é equivocada e que o peso do imposto único sobre o contribuinte independe da inflação. A alíquota de 1% não possui propriedades místicas. A alíquota de 1% nunca foi definida como a que seria necessária para "garantir o financiamento não inflacionário" do setor público. É surpreendente que sequer se possa imaginar uma alíquota com tão extasiante propriedade: a de ser não inflacionária. Afinal, o "financiamento não inflacionário" não depende exclusivamente da alíquota tributária, mas sim da relação entre esta alíquota (que define a taxa de extração de recursos do setor privado) e o nível de gastos realizados pela administração pública. A alíquota de 1% foi estimada como a necessária para garantir neutralidade arrecadatória frente à tendência mais recente na receita tributária. Nada mais do que isso. A arrecadação que o imposto único deseja substituir. As discrepâncias nas estimativas do produto nacional do IBGE, do Banco Central e do Banco Mundial são acentuadas. Nesse sentido, a afirmação usualmente aceita de que durante a década de 80, a carga tributária bruta situou-se entre 22% e 25% do PIB é apenas indicativa. Não há sentido em calibrar a alíquota do imposto único para uma meta percentual relativa ao PIB (qual deles?). Daí estabelecer como meta os montantes absolutos que vinham sendo arrecadados no período, entre US$ 80 bilhões e US$ 90 bilhões. O imposto único visa eliminar os impostos e contribuições existentes, mantendo apenas aqueles com características predominantemente extrafiscais, como por exemplo o imposto sobre comércio exterior. Permanecem as taxas pela prestação de serviços e as contribuições pessoais e associativas, como o FGTS, o PIS-Pasep, os recolhimentos ao Sesc, Senai etc. Assim, somando-se a arrecadação tributária do governo federal com a receita do ICMS, temos um valor que representa a virtual totalidade das receitas tributárias do país que se deseja substituir com o imposto único. Pelos dados do quadro, vê-se que:





Como podemos ver, US$ 85 bilhões é uma arrecadação suficiente para uma política econômica compatível com a estabilidade monetária e o controle do déficit público, desde que dentro de um programa coerente de ajuste fiscal. A permanência da fúria arrecadatória de todas as administrações pode levar a alíquota de 1% a não ser suficiente, o que não implica crítica ao imposto único, mas sim ao desatino dos governantes que buscam ajustar o governo sempre pelo lado do aumento da arrecadação e raramente pelo lado da busca de eficiência.


Os efeitos do imposto único independem da inflação. Mais ainda, é equivocada a afirmação de que o peso do IUT aumenta com a queda na inflação. Tomemos o caso de uma aplicação financeira de 100 unidades monetárias, com correção monetária de 30% e juros reais de 10%. Ao final do período, o capital corrigido é de 130, e a remuneração de 13, perfazendo um crédito total de 143. A alíquota de 1% do IUT implica arrecadação de 1,43, que pode ser distribuída entre o valor original (1% de 100), a correção (1% de 30), e os juros reais, (1% de 13). No total, a operação líquida de imposto rendeu 141,57, ou seja, um retorno de 8,9% no período. Se a inflação fosse zero, o crédito bruto da operação seria de 110 e o imposto atingiria 1,1. O retorno líquido seria de 108,9, ou seja, um rendimento real de 8,9%. Exatamente o mesmo que com inflação de 30%. Com inflação zero, mil ou 1 milhão, o peso do imposto único será sempre o mesmo.


O imposto único na arena política


Mas o imposto único também sofreu uma inesperada investida em um artigo publicado na Folha no dia 21/09 por um deputado, o sr. José Aníbal. Sob o pretexto de responder à publicação de minha autoria veiculada dois dias antes, na qual eu fazia uma análise política da atual campanha eleitoral, aquele sr. desandou a fazer acusações vagas e maliciosas, utilizando-se da tática fascista de tentar desqualificar o adversário, ao invés de rebater as ideias sobre as quais discorda. Impelido por uma fúria cega, irracional e leviana, investiu até contra o imposto único, que em nada se relacionava com os temas em debate.


Em meu artigo de 19/09, expressei opinião positiva acerca da campanha de Fernando Henrique Cardoso. Ao mesmo tempo, demonstrei ceticismo quanto à vitória de Mário Covas no primeiro turno. Finalmente, defendi a dobrada FHC-Munhoz por acreditar que o candidato do PMDB, Barros Munhoz, "surge como um candidato afinado com a visão de mundo de Fernando Henrique Cardoso", e que eles se complementam "para que São Paulo possa liderar um processo multiplicador de riqueza e desenvolvimento por todo o país". Em realidade, não julguei, em meu artigo, a competência administrativa de Mário Covas. Apenas apontei que ela existe em FHC e em Barros Munhoz.


Mas o que deve ter irritado o furibundo deputado foi a menção às acusações de irregularidades financeiras contra Mário Covas. Quero esclarecer aos leitores que não as formulei. Apenas as mencionei, pois estavam nos grandes jornais de São Paulo. E disse que poderiam causar "algum desgaste na candidatura de Mário Covas".


Quanto ao imposto único, gostaria que o deputado explicasse melhor sua afirmação de que o projeto "faz a alegria de quem quer sonegar a sonegação e a evasão fiscal...". Gostaria que explicitasse abertamente por que acredita que os defensores do imposto único são parceiros da sonegação e da evasão. Mas com coragem, deputado, sem meias palavras, sem perfídia, mesmo contrariando seu temperamento.


MARCOS CINTRA CAVALCANTI DE ALBUQUERQUE, 48 anos, doutor em economia pela Universidade de Harvard (EUA), é vereador de São Paulo pelo PL e professor titular da Fundação Getúlio Vargas. Foi secretário do Planejamento e de Privatização e Parceria do município de São Paulo na administração Paulo Maluf.

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