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  • Marcos Cintra

Da mão para a boca

A "reforma" tributária anunciada pelo governo na última sexta-feira revela apenas improvisação e falta de planejamento. Não se pode levar a sério essa pretensa reforma, preparada de afogadilho e apresentada às vésperas do recesso parlamentar. O Congresso será pressionado para votar a matéria rapidamente, para dar eficácia às propostas já a partir de janeiro. Trata-se apenas de um apelo patético do Executivo para que o Legislativo lhe dê condições mínimas de sobrevivência no próximo ano. Exemplo disso é a previdência, que não dispõe de recursos para pagar o abono de Natal dos aposentados.


Estima-se que o pacote (esse é o nome correto) irá aumentar a arrecadação de impostos em cerca de US$ 13 bilhões, sendo que as empresas arcarão com tributos adicionais de mais de US$ 8 bilhões, os assalariados de classe média pagarão mais US$ 0,5 bilhão, e os restantes US$ 4,5 bilhões incidirão sobre todos os contribuintes, na forma de indexação dos encargos tributários.


O presidente Collor afirmou que esperava reduzir a economia informal e combater a sonegação. Ao aumentar o número dos contribuintes, todos pagarão, e cada um pagará menos. Perfeito. Só que o pacote anunciado nada faz para tornar este desejo realidade. A economia informal continuará subterrânea, pois as formas de sonegação e de evasão tributárias continuam tendo a mesma eficácia que tinham anteriormente. Em realidade, o pacote apenas altera alíquotas. Não muda a estrutura tributária brasileira, e, portanto, nada faz para combater a evasão, a sonegação e a corrupção.


A maior parte do aumento de arrecadação incide sobre as empresas, e, portanto, será repassada aos preços. Os ganhos dos assalariados na base da pirâmide de rendimentos são, portanto, ilusórios. As demais medidas, como extinção de várias taxas, são penduricalhos sem maior significado. Em realidade, no front tributário tudo permanece como sempre. Alíquotas elevadas, brutais índices de sonegação, queda de arrecadação, aumento da economia marginal e corrupção. Continua faltando estabilidade de regras. Não há critérios claros e permanentes de tributação. Há apenas uma certeza: a de que no final do próximo ano haverá uma nova proposta de "reforma" tributária do Executivo.


É preciso dar um basta. O Legislativo não pode, mais uma vez, dizer amém. Vamos dizer não, para que o governo apresente um projeto mais coerente e faça um ajuste condizente com a gravidade do quadro econômico brasileiro.



Marcos Cintra Cavalcanti de Albuquerque, 45, é doutor pela Universidade de Harvard (EUA), professor da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas, consultor de economia da Folha e presidente regional do PDS.

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