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  • Marcos Cintra

Desoneração da Folha, INSS e competitividade

Durante a audiência pública realizada em 29 de setembro na Comissão de Trabalho, de Administração Pública e Serviços da Câmara dos Deputados, os auditores da Receita Federal expressaram preocupação com um possível impacto negativo da desoneração da folha de pagamentos sobre a Previdência Social brasileira. Segundo eles, os benefícios previdenciários retiraram 23 milhões de pessoas da pobreza, e qualquer mudança nessa área requer uma discussão mais aprofundada.


Para o setor industrial, também presente na audiência pública, a desoneração tributária sobre a folha de pagamentos não pode se restringir à simples transferência de base de cobrança, como vem sendo cogitada. Utilizar o faturamento ou o valor agregado, alternativas propostas por alguns segmentos empresariais e burocratas, continuaria pressionando os custos de produção e não restabeleceria a competitividade do país.


O temor dos auditores fiscais quanto ao impacto de uma mudança de base de cobrança sobre a receita previdenciária é compreensível. É necessário reconhecer que a sociedade tem interesse na sustentabilidade da Previdência, e qualquer medida que gere alguma dúvida sobre a saúde financeira do INSS é vista com desconfiança pelos participantes do sistema. Cumpre dizer que a escolha do faturamento ou do valor agregado é temerária porque ambas manteriam a estrutura vulnerável à evasão e também porque são extremamente voláteis em tempos de crise econômica.


Quanto à simples mudança de base que o setor industrial destacou, cabe lembrar que a experiência recente que o governo realizou com alguns setores contemplados no Plano Brasil Maior gerou descontentamento. Os segmentos têxtil, calçadista e moveleiro reclamam que a troca da folha de pagamentos pelo faturamento não serviu para desonerar a produção, e em alguns casos houve até aumento da carga tributária.


A base alternativa para a desoneração da folha de pagamentos que pode proporcionar receita estável para a Previdência Social, atendendo à necessidade levantada pelos auditores fiscais, e que amplia a competitividade das empresas, como deseja o setor industrial, é a adoção da proposta da Confederação Nacional de Serviços (CNS), também presente na audiência, que prevê a substituição total do INSS patronal por um tributo de 0,6% sobre a movimentação financeira.


A proposta da CNS substitui um tributo declaratório por outro não declaratório, cuja cobrança seria automática. Isso praticamente eliminaria a expressiva sonegação que ocorre com o INSS patronal. Além disso, a base tributária indicada pela entidade é mais estável que a folha de salários, o faturamento e o valor agregado.


Quanto ao impacto nos custos, um estudo utilizando a matriz interindustrial do IBGE e dados das Contas Nacionais revela que o projeto da CNS estimularia a competitividade da economia brasileira devido à redução expressiva na carga tributária de vários produtos. Para se ter uma ideia, para os quatro setores contemplados no Plano Brasil Maior, os impactos em termos de queda do ônus sobre os preços seriam: calçados de 16,8% para 1,7%; móveis, de 16,7% para 1,4%; produtos têxteis, de 16,1% para 1,6%; e softwares, de 14,8% para 1,2%.


É preciso avançar rapidamente na questão da desoneração da folha de pagamentos, e o projeto da CNS é o que pode gerar convergência quanto aos interesses do governo, do setor produtivo e dos beneficiários da Previdência. É uma alternativa que permite ganhos para todos.


 

Marcos Cintra é doutor em Economia pela Universidade Harvard (EUA), professor titular e vice-presidente da Fundação Getulio Vargas. www.marcoscintra.org


Publicado no Jornal Perfil Econômico: 21/10/2011

Publicado no PL Impacto: 30/10/2011

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