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  • Marcos Cintra

Reforma tributária agride Pacto Federativo, diz Cintra

Para o vice-presidente da FGV, os municípios são os mais prejudicados na reforma tributária.


Por: Cláudio Isaías - Jornal do Comércio - RS


"A discussão sobre a Reforma Tributária brasileira poderia ser feita de maneira muito mais simples, mais tranquila e sem grandes traumas". A análise é do professor Marcos Cintra, vice-presidente da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e ex-secretário da Receita Federal, que nesta terça-feira participou da reunião-almoço promovida pelo Sindicato dos Concessionários e Distribuidores de Veículos do Rio Grande do Sul (Sincodiv/RS), onde debateu o "Cenário econômico, risco fiscal e a reforma tributária". Para Cintra, simplicidade e ampliação da base para reduzir alíquotas daqueles que estão pagando deveriam ser as grandes prioridades da discussão do sistema tributário do País. O vice-presidente da FGV afirma que a reforma tributária em discussão não garante neutralidade. Cintra destaca que ela desloca a carga tributária muito fortemente de alguns setores para outros e afirma que os municípios são os grandes perdedores com o sistema tributário.


Jornal do Comércio - A Reforma Tributária que está em discussão no Brasil é uma reforma muito diferente de qualquer outra que o País já teve?


Marcos Cintra - Ela não é uma reforma tributária diferente. É uma reforma que poderia ser feita de maneira muito mais simples, mais tranquila e sem grandes traumas. A maior parte do que se pretende mudar nessa reforma podia ser feita por legislação infraconstitucional sem agredir o Pacto Federativo, respeitando as instituições e a organização federativa do País. Ela está movendo montanhas para fazer reformas que poderiam ser realizadas de maneira muito mais objetiva e mais rápida se fosse feita por legislação. O segundo grande aspecto é que essa reforma tributária não garante neutralidade. Ela desloca a carga tributária muito fortemente de alguns setores para outros. Ou seja, haverá grandes ganhadores e grandes perdedores e isso faz com que a reforma seja muito polêmica, e consequentemente menos desejável do que poderia ser.


JC - O que deveria ser priorizado na reforma tributária brasileira?


Cintra - Deveria ser priorizada a busca principal pela simplificação do sistema tributário. Tanto o Imposto sobre o Valor Agregado (IVA) quanto o Imposto de Renda podem ser simples ou complicados, dependendo do processo administrativo fiscal. O Brasil é um país que aparentemente gosta muito da burocracia e da complexidade. O contribuinte busca maior simplicidade, mais transparência, mais objetividade e menos litígio. A carga tributária do Brasil é alta, mas nós precisamos torná-la mais simples. Precisamos diminuir a carga tributária trazendo para o universo tributário quem sonega e quem está na evasão ou na informalidade, que é um amplo segmento da economia brasileira.


JC - Quais são as vantagens para os estados e os municípios com a reforma tributária?


Cintra - Os estados continuarão basicamente com o seu principal tributo, que é o ICMS, agora ampliado com a incorporação do ISS. Do ponto de vista de gestão, os municípios são os grandes perdedores, mas não a totalidade dos 5.500 municípios, dos quais 450 ou 500 são grandes e médios e dependem muito do ISS, com uma arrecadação crescente. Esses municípios vão perder esse tributo e passarão a ser sócios minoritários em outro imposto, que é o IBS, no qual eles não terão controle total. Já os pequenos municípios terão ganhos e passarão a ter uma arrecadação que não tinham antes - os municípios não recebiam uma fatia do ICMS. É uma reforma tributária que não consegue garantir neutralidade nem mesmo para os municípios. Haverá municípios amplamente vencedores e municípios amplamente perdedores, e tudo isso é muito ruim para o Brasil.


JC - O modelo de reforma tributária debatido no Brasil vai mexer no Pacto Federativo?


Cintra - O modelo mexe profundamente no Pacto Federativo porque ele tira a competência tributária dos estados e dos municípios. Na realidade, o projeto original queria centralizar também os tributos da União. Porém, o governo federal não permitiu a gestão dos seus tributos. Já os estados e municípios não conseguiram resistir e isso é uma alteração no Pacto Federativo. Constitucionalmente, estados e municípios têm competências tributárias muito específicas que deixaram de ter na medida em que esses impostos terão uma gestão unitária e não mais dos entes federados.


JC - Por que o senhor afirma que a reforma tributária vai jogar o Brasil num "mar de incertezas"?


Cintra - Isso vai acontecer porque tudo está sendo remetido para a Lei Complementar. Estamos discutindo alguns conceitos que são polêmicos e que deveriam ser discutidos em seus detalhes. Por exemplo, qual será a alíquota desse imposto? Alguns setores terão alíquota reduzida e de quanto será essa redução? Essa insegurança somente será dirimida quando começarmos a discutir os detalhes operacionais do sistema tributário em 2024 e 2025.

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