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Marcos Cintra - Revista Conjuntura Econômica

Os custos dos congestionamentos da cidade de São Paulo

Segundo o Departamento Nacional de Trânsito (Denatran), em setembro de 2012, a cidade de São Paulo contava com mais de 4,8 milhões de automóveis, representando 11,5% da frota brasileira. Entre 2001 e 2012, a frota paulistana cresceu 54%. No mesmo período, a população da cidade cresceu apenas 8%. Com isso, o número de automóveis por habitante passou de 0,30 para 0,42, quase o dobro do índice nacional de 0,22.


O crescimento da frota de automóveis em São Paulo gerou uma elevação na demanda por vias de circulação. No curto prazo, a oferta dessas vias é inelástica. Investimentos na infraestrutura viária e no transporte coletivo de alta capacidade não foram suficientes para criar alternativas de locomoção de bens e pessoas pelo município, tornando a crise de mobilidade inevitável. O trânsito tornou-se congestionado, mesmo com a adoção de medidas como o rodízio de veículos e as restrições à circulação de caminhões. Essa situação impõe um custo elevado e crescente para o setor produtivo e para a qualidade de vida da população paulistana.


A estimativa dos custos dos congestionamentos na cidade de São Paulo foi diferenciada em dois tipos: o custo de oportunidade do tempo perdido das pessoas ociosas no trânsito e os dispêndios monetários causados pela lentidão, mais especificamente os custos adicionais de combustíveis, transporte de mercadorias e emissão de poluentes. O custo de oportunidade é um valor teórico relacionado ao uso alternativo do tempo gasto pela população nos congestionamentos. O ponto de partida foi estimar o valor médio da hora de trabalho dos paulistanos, tendo como referências o PIB e a população economicamente ativa ocupada da cidade de São Paulo.


Os custos pecuniários do congestionamento foram estimados a partir de funções contidas em um estudo coordenado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) em parceria com a Associação Nacional de Transporte Público (ANTP), que têm como variáveis dependentes o consumo de combustível e a emissão de poluentes, e como variável independente a velocidade de circulação dos veículos.



O custo relacionado à poluição se refere aos seus reflexos nas despesas de tratamento público de doenças respiratórias, alergias, irritações de órgãos, entre outros.


Em ambos os casos, foram comparadas situações sem congestionamento e com lentidão, conforme a tabela abaixo. Em situação de ausência de congestionamento, considerou-se a hipótese de uma velocidade média de 50 km/h para carros e de 30 km/h para os ônibus.


Para a apuração do custo do transporte de carga, foram utilizadas funções desenvolvidas pela NTC & Logística (Associação Nacional do Transporte Rodoviário de Cargas e Logística). Considerou-se o aumento do custo da tonelada em um percurso médio entre 31 km e 40 km em função de uma queda na velocidade de 50 km/h para a velocidade média estimada para cada ano.


Resultados


Os resultados apresentados na tabela da página 65 revelam que os custos estimados dos congestionamentos são crescentes ao longo do tempo. No caso dos custos pecuniários, os desembolsos passaram de R$ 7 bilhões, em 2002, para R$ 10 bilhões, em 2012. Já os custos de oportunidade saltaram de R$ 10,3 bilhões para R$ 30,2 bilhões no mesmo período. No total, as perdas saíram de R$ 17,3 bilhões, em 2002, para R$ 40,1 bilhões, em 2012.


A revascularização do fluxo diário


São Paulo é vítima de uma concepção urbanística ultrapassada. Segue o modelo de uma cidade formada por um núcleo central rodeado por centros periféricos residenciais e comerciais de segunda ordem. O sistema viário segue essa lógica, com a construção de grandes artérias radiais para onde flui o trânsito, na expectativa de que os veículos circulem em velocidades mais elevadas em direção a esses pontos centrais.


Paradoxalmente, os congestionamentos se concentram nas grandes vias arteriais e em seus acessos. Ao mesmo tempo, o restante do leito carroçável fica ocioso mesmo nos horários de pico. A perversa lógica viária arrasta os motoristas para as vias arteriais por meio de complexos sistemas de mão e contramão, bloqueios de vias e redes de semáforos que privilegiam as grandes correntes de tráfego.



Vale uma comparação de São Paulo com a ilha de Manhattan, em Nova York. Na capital paulista, são 1.500 km², por onde circulam quase sete milhões de veículos, ou seja, pouco mais de 4,6 mil veículos por km². Em Manhattan, com área de 87,5 km², circulam cerca de 2 milhões de veículos, ou quase 23 mil carros por km². Mesmo tendo cinco vezes a densidade de veículos de São Paulo, os congestionamentos lá são bem menos intensos. Os veículos ocupam de maneira mais ou menos homogênea todas as vias da ilha, fazendo o trânsito fluir por toda a superfície carroçável com mais velocidade.


O sistema arterial concentrador de fluxo deixou de funcionar. Ele demanda investimentos pesados em infraestrutura viária. Os túneis Ayrton Sena, Jânio Quadros, Faria Lima, Rebouças e a ponte estaiada do complexo Real Parque custaram quase R$ 3 bilhões, mas não geraram benefícios significativos para a circulação de pessoas e de cargas. Caso esses recursos tivessem sido aplicados, por exemplo, na construção de 80 pontes sobre os rios Pinheiros e Tietê e/ou na interligação de vias lindeiras às marginais, a cidade teria um sistema revascularizado que reduziria os atuais congestionamentos.


Em vez de grandes obras, seria mais eficaz realizar um conjunto de obras de porte menor em todos os pontos críticos da cidade, de forma a criar um sistema integrado de circulação paralela às grandes artérias. A médio prazo, estaria-se criando uma malha de vias reticulares por toda a cidade, desconcentrando fluxos de veículos, retirando-os das artérias entupidas e aproveitando melhor cada metro quadrado dos mais de 16 mil quilômetros de vias existentes em São Paulo, que hoje ficam ociosas, exceto para o trânsito local.


Transportes coletivos, com ênfase em investimentos em metrô, são constantemente lembrados como a única solução definitiva. No entanto, isso exige um grande volume de recursos e provavelmente serão necessárias algumas décadas até que a cidade tenha uma rede de transporte público de massa adequada às suas necessidades.


Marcos Cintra Cavalcanti de Albuquerque é vice-presidente da FGV.



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